“ De provação em provação, a
filosofia enfrentaria seus rivais cada vez mais insolentes, cada vez mais
calamitosos, que Platão ele mesmo não teria imaginado em seus momentos mais
cômicos. Enfim, o fundo da vergonha foi atingido quando a informática,o
marketing, o design, a publicidade, todas as disciplinas da
comunicação,apoderaram-se da própria palavra conceito, e disseram: é nosso
negócio, somos nós os criativos, nós somos os conceituadores! Somos nós os amigos do conceito, nós os colocamos
em computadores. Informação e criatividade, conceito e empresa: uma abundante
bibliografia já... O marketing reteve a ideia de uma certa relação entre o
conceito e o acontecimento; mas eis que o conceito se tornou o conjunto das apresentações
de um produto (histórico, científico, artístico, sexual, pragmático...) e o
acontecimento, a exposição que põe em cena apresentações diversas e a ‘troca de
ideias’ à qual supostamente dá lugar. Os únicos acontecimentos são as
exposições, e os únicos conceitos, produtos que se pode vender. O movimento geral que substituiu a Crítica pela
promoção comercial não deixou de afetar a filosofia. O simulacro, a simulação
de um pacote de macarrão tornou-se o verdadeiro conceito, e o apresentador-expositor
do produto, mercadoria ou obra de arte,tornou-se o filósofo, o personagem conceitual
ou o artista. Como a filosofia, essa velha senhora, poderia alinhar-se com os
jovens executivos numa corrida aos universais da comunicação para determinar
uma forma mercantil do conceito, MERZ? Certamente, é doloroso descobrir que ‘Conceito’
designa uma sociedade de serviços e de engenharia informática. Mas, quanto mais
a filosofia tropeça com rivais imprudentes e simplórios, mais ela os encontra
em seu próprio seio, pois ela se sente preparada para preencher a tarefa, criar
conceitos,que são antes meteoritos que mercadorias. Ela tem ataques de riso que
acabam com suas lágrimas. Assim, pois, a questão da filosofia é o ponto
singular onde o conceito e a criação se remetem um ao outro.”
In O QUE É A FILOSOFIA?. Gilles
Deleuze – Félix Guattari, Editora 34, RJ, 1992.

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